"Pelo presente termo [sic] assumo o compromisso com a direção do PSDC-Candeias em repassar os recursos abaixo descritos, a fim do mesmo [sic] apoiar a nossa candidatura a prefeito do município de Candeias para as eleições municipais de 2012". O documento, escrito – aparentemente – a próprio punho, foi encaminhado pelo diretório estadual do PMDB à Polícia Federal, à Comissão de Ética e à presidência nacional da legenda, pedindo a expulsão de um membro do partido: Sargento Francisco, atual prefeito de Candeias, e eleito em 7/10 para a Prefeitura pelo próprio PMDB.
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As denúncias que cercam Francisco desde que assumiu o Município, em junho, não param de surgir. O pedido de expulsão veio acompanhado de um requerimento para anular a convenção do partido em Candeias, ocorrida em 30/6, que o escolheu como candidato.
O PMDB acusa Francisco de infidelidade partidária e aponta irregularidades na convenção que o escolheu candidato. Segundo documento apresentado ao Comitê de Ética do PMDB, Sargento Francisco apresentou-se como pré-candidato apenas no dia do evento e foi escolhido numa convenção em cuja ata não aparece nem quem assinou nem quem o escolheu – ferindo o estatuto da legenda.
Para o presidente estadual do PMDB, deputado Lúcio Vieira Lima, uma prefeitura a mais não interessa à legenda. "É muito mais importante contribuir com a moralidade pública. [Você] vai colocar como prefeito alguém que assina um documento comprando partido?", declarou.
"Compra com dinheiro público"
Segundo Lúcio Vieira Lima, presidente estadual do PMDB, já estava decidido que o partido faria coligação com o PR em Candeias e apoiaria a ex-prefeita Tonha Magalhães (PR): "Ele [Sargento Francisco] esteve comigo, levou o acordo de apoiar o PR e, depois, simplesmente, fez a convenção colocando o nome dele, não respeitando o acordo", disse.
Francisco, que havia acabado de assumir a prefeitura por conta da cassação do mandato da correligionária Maria Maia, apresentou-se como pré-candidato à prefeitura pelo PMDB no dia 30/6 e sagrou-se candidato. Na convenção, nenhuma candidatura a vereador foi discutida, o que levou o partido a denunciar Francisco por ferir os princípios éticos da legenda.
Para Lúcio, o mais grave é o uso do erário. "Nessa convenção, para se viabilizar candidato, tem documentos em que ele compra partidos com dinheiro público", afirma o presidente estadual do PMDB.
"Não sei do que se trata"
De acordo com o Código de Ética do PMDB, a "conduta pessoal indecorosa", a "incompatibilidade manifesta com os postulados e a orientação política do partido" e a "atividade política contrária ao regime democrático ou aos interesses do Partido" podem ocasionar a expulsão de um membro da legenda.
Conforme o documento entregue ao Comitê de Ética, o fato de o atual prefeito ter levado a cabo uma candidatura que "não tem a menor viabilidade política e eleitoral" indica que a convenção que o escolheu serviu "como um instrumento de mera satisfação pessoal do senhor Francisco Silva Conceição".
O Jornal da Metrópole entrou em contato com o Sargento Francisco para que ele respondesse às acusações. "Não sei do que se trata. Isso não existe, não", afirmou.
Nem Tonha Magalhães, nem Ângelo
Após a direção nacional do PMDB acatar o pedido de cancelamento da convenção municipal de 30/6, o diretório municipal ao qual pertencia Francisco foi dissolvido.
Segundo Lúcio Vieira Lima, outro diretório, independente, foi criado. Este, por sua vez, realizou convenção em 20/7. Os escolhidos foram Ângelo Hilário Sales Silva (prefeito) e Diego Melo Aragão (vice-prefeito). Em outubro, porém, foi o próprio Sargento Francisco quem concorreu – e ganhou – o pleito, com 40,5% dos votos válidos.
No dia do pleito, Sargento Francisco já estava com a filiação ao PMDB suspensa, mas conseguiu disputar a eleição com uma liminar concedida pela Vara de Fazenda Pública, o que não é costumeiro, segundo Vieira Lima, em casos eleitorais.
Emergência não foi homologada
Denúncia publicada pelo Jornal da Metrópole se confirmou: o decreto de emergência publicado pelo prefeito de Candeias em 29/6, foi irregular. Após o decreto, Francisco firmou uma série de contratos por dispensa ou inexigibilidade de licitação e contratou mais de mil servidores temporários em um mês.
Só que, para um decreto de emergência ter validade, é preciso que o governo, através da Defesa Civil, homologue o ato. Não foi o que aconteceu: o ex-deputado Júnior Magalhães questionou a Coordenação de Defesa Civil do Estado (Cordec) e foi informado de que "Candeias não encaminhou recentemente nenhuma solicitação de homologação governamental para decreto de situação de emergência". Segundo a Cordec, a última ocorrência homologada data de 9/11/2011, quando fortes chuvas atingiram a cidade.
R$ 100 mil em buffet e flores
Mesmo tendo decretado estado de emergência, o prefeito fez gastos nada urgentes: como publicado no Diário Oficial do Município de 6/11, contratou serviços de buffet (R$ 59.425) e aquisição de flores (R$ 40.900). Em 8/11, foi publicado o extrato do contrato com o Grupo Multi Eventos Ltda, de R$ 249.499,98, para contratação de cerimonial. Os contratos foram firmados em 10/8, mas publicados no Diário Oficial apenas 90 dias depois, o que fere o princípio da publicidade, que determina que a publicação seja feita até o quinto dia útil do mês seguinte à assinatura.
O vereador Preto Magalhães (PR) questiona a publicação tardia dos contratos e a razoabilidade de se contratar buffet e flores a esses valores. "Uma cidade que diz que está em emergência pode contratar buffet para eventos e adquirir flores para festas?", indaga, em documento ao Tribunal de Contas dos Municípios (TCM).
Doações de campanha suspeitas
Com a divulgação pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) dos doadores de campanha da eleição de 2012, outras suspeitas surgiram. A coligação Para Reconstruir Candeias, de Tonha Magalhães (PR), entrou com uma ação no Ministério Público (MP-BA) contestando os mais de 50% das doações (R$ 431 mil) feitas em espécie. Desta soma, R$ 251 mil foram recebidos na última semana.
A empresa ESP Pisos Industriais Comércio e Importação e Exportação Ltda, que tem sede em Cosmópolis (SP), doou R$ 166 mil em espécie ao Sargento Francisco. A empresa Tharse Supermercado Ltda, com sede em Candeias, doou R$ 55 mil. Para fazer a doação, a empresa precisaria ter faturamento de R$ 2,75 milhões, o que, para os denunciantes, é "estranho", já que a empresa é de pequeno porte e foi aberta há pouco mais de um ano. A coligação contesta ainda a ausência de identificação dos doadores em transferências eletrônicas – que são 45% de todas as doações recebidas.
Clarissa Pacheco – Jornal da Metrópole