O presidente Luiz Inácio Lula da Silva enfatizou a importância da diplomacia, da cooperação e do multilateralismo como estratégias essenciais para enfrentar os desafios contemporâneos. Em um artigo publicado nesta quinta-feira (10) em veículos de comunicação de diversos países, Lula alertou que a predominância da “lei do mais forte” representa uma séria ameaça ao sistema de comércio multilateral.
Embora não tenha mencionado diretamente as recentes decisões do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que anunciou a implementação de tarifas de 50% sobre as exportações brasileiras, Lula criticou a adoção de tarifas abrangentes, que, segundo ele, tendem a empurrar a economia global para uma “espiral de preços altos e estagnação”.
“A Organização Mundial do Comércio foi esvaziada, e poucos se lembram da rodada de desenvolvimento de Doha”, destacou o presidente.
Lula reiterou a necessidade de reorganizar os organismos multilaterais para resolver os conflitos internacionais. “Se as organizações internacionais parecem ineficazes, isso se deve ao fato de que sua estrutura não reflete mais a realidade atual. As ações unilaterais e excludentes são agravadas pela falta de uma liderança coletiva. A solução para a crise do multilateralismo não é abandoná-lo, mas reconstruí-lo em bases mais justas e inclusivas”, argumentou o presidente.
O artigo foi publicado em importantes jornais, como o inglês The Guardian, o argentino Clarín e o chinês China Daily.
Papel da ONU
De acordo com Lula, o ano de 2025 deveria ser um marco de celebração devido aos oitenta anos da Organização das Nações Unidas (ONU), mas corre o risco de ser lembrado como o momento em que a ordem internacional, estabelecida desde 1945, entrou em colapso. Lula ressaltou que o mundo atual difere consideravelmente do cenário que emergiu após a Segunda Guerra Mundial, com novas forças políticas e econômicas surgindo e criando novos desafios. As “rachaduras” que ameaçam o papel da ONU em mediar conflitos já eram visíveis há tempos.
“Desde as invasões do Iraque e do Afeganistão, passando pela intervenção na Líbia e o conflito na Ucrânia, alguns membros permanentes do Conselho de Segurança banalizaram o uso ilegal da força. A incapacidade de agir em relação ao genocídio em Gaza representa uma negação dos valores fundamentais da humanidade. A dificuldade em superar as divergências alimenta uma nova escalada de violência no Oriente Médio, cujo último capítulo inclui o ataque ao Irã”, enfatizou.
Lula também lembrou que a crise financeira global de 2008 expôs os fracassos da globalização neoliberal. Em vez de reorientar as políticas, o mundo permaneceu preso a manuais de austeridade. “A escolha de socorrer os ultra-ricos e as grandes corporações em detrimento dos cidadãos comuns e das pequenas empresas aprofundou a desigualdade”, disse.
Para o presidente, o cerceamento da capacidade de ação do Estado gerou desconfiança nas instituições. Esse descontentamento tornou-se um terreno fértil para narrativas extremistas que ameaçam a democracia e promovem o ódio como estratégia política.
Em vez de redobrar esforços para reduzir desigualdades, muitos países cortaram programas de cooperação internacional. “Não se trata de caridade, mas de enfrentar disparidades enraizadas em séculos de exploração e violência contra os povos da América Latina, Caribe, África e Ásia. Em um mundo com um PIB combinado superior a US$ 100 trilhões, é inaceitável que mais de 700 milhões de pessoas ainda vivam em condições de fome e sem acesso a eletricidade ou água”, destacou.
Crise climática
O presidente exigiu maior responsabilidade dos países mais ricos em relação à crise climática, uma vez que eles são os principais emissores de carbono. “O ano de 2024 foi o mais quente já registrado, evidenciando que a realidade avança mais rapidamente do que as diretrizes do Acordo de Paris. As obrigações do Protocolo de Kyoto foram substituídas por compromissos voluntários, e as promessas de financiamento feitas na COP 15 em Copenhague em 2009, que prometiam US$ 100 bilhões anuais, nunca se concretizaram. O recente aumento nos gastos militares da OTAN torna essa possibilidade ainda mais distante”, avaliou.
Lula destacou que os ataques às instituições internacionais ignoram os benefícios concretos que o sistema multilateral trouxe à vida das pessoas, citando a erradicação de doenças como a varíola e ações para preservar a camada de ozônio. “Em tempos de crescente polarização, termos como ‘desglobalização’ têm se tornado comuns, mas é impossível ‘desplanetar’ nossa realidade compartilhada. Nenhum muro é alto o suficiente para criar ilhas de paz e prosperidade cercadas por violência e miséria”, concluiu.
“Esse é o entendimento que o Brasil, cuja vocação sempre foi promover a cooperação entre as nações, demonstrou durante sua presidência do G20 no ano passado e continua a demonstrar em suas lideranças no Brics e na COP 30 neste ano: que é possível encontrar pontos em comum mesmo em cenários adversos”, finalizou Lula. Com informações da Agência Brasil.