As mudanças ambientais globais representam um desafio complexo para a ciência e a sociedade. Uma forma inovadora de olhar para essas questões é derrubando as barreiras disciplinares e incorporando diferentes formas de conhecimento em busca de novas soluções. Essa é a aposta da transdisciplinaridade e o mote de uma Escola São Paulo de Ciência Avançada realizada entre os dias 8 e 18 de abril em São Luiz do Paraitinga, cidade histórica localizada no Vale do Paraíba paulista. Apoiado pela FAPESP, o evento reuniu mais de 80 participantes de 30 países.
“A pesquisa transdisciplinar é aquela delineada em parceria com atores sociais, seja governo, sociedade civil organizada, setor privado ou comunidades, por exemplo”, explicou Cristiana Seixas, integrante do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais da Universidade Estadual de Campinas (Nepam-Unicamp) e coordenadora da escola. “O envolvimento dos atores sociais é a espinha dorsal dessa abordagem. Se as pessoas se envolvem no processo desde o início, há um comprometimento maior e, assim, a construção conjunta de soluções e sua implementação têm muito mais chance de dar certo.”
A pesquisa transdisciplinar vem ganhando força nos últimos anos. A Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES), também conhecida como o IPCC da biodiversidade, está produzindo um relatório global sobre mudanças transformadoras com especialistas de todo o mundo. A ideia é encontrar novas abordagens para responder a questões complexas.
A proposta da escola buscou inovar ao capacitar 80 jovens cientistas dos cinco continentes, 42 deles do Brasil, a olhar para os problemas ambientais sob uma nova perspectiva. “As Escolas de Ciência Avançada são financiadas dentro da linha de desenvolvimento do conhecimento e inovação. Estamos sempre em busca de projetos ousados, inovadores e de alta qualidade, novas parcerias e oportunidades e as escolas são um dos maiores instrumentos da FAPESP para tornar o conhecimento disponível ao maior número de pessoas, principalmente os jovens”, disse Carlos Graeff, coordenador geral de Programas Estratégicos da FAPESP.
Para a cientista social e geógrafa Laila Sandroni, é preciso fortalecer o esforço de produzir soluções inovadoras para resolver problemas ambientais de forma colaborativa. A pesquisadora faz parte do Instituto Interamericano para Pesquisa de Mudanças Globais (IAI), instituição parceira do evento e que tem como objetivo coordenar pesquisas científicas e econômicas sobre a extensão, as causas e as consequências das mudanças globais nas Américas.
Durante as duas semanas da escola, as atividades foram realizadas em diferentes espaços do município de São Luiz do Paraitinga e região, incluindo visitas a experiências e organizações locais, comunidades tradicionais e instituições de pesquisa e atividades culturais, um formato que procura incentivar o envolvimento da comunidade e contribuir para a economia local.
Mudanças transformadoras
A concepção da escola envolveu a combinação de diferentes estratégias pedagógicas para criar um formato inovador. A proposta combina oito competências para o treinamento em sustentabilidade: pensamento sistêmico, pensamento futuro, consideração de múltiplos valores, pensamento estratégico, habilidades interpessoais, habilidades intrapessoais, habilidades de implementação e habilidades de integração.
O programa da escola foi dividido em quatro módulos: compreender as mudanças ambientais globais e conceitos-chave; aprender abordagens metodológicas e analíticas de diferentes áreas; colaborar entre disciplinas e atores sociais para promover mudanças transformadoras na interface ciência e política; e lidar com os desafios associados a tais mudanças. Para alcançar isso, o programa incorpora as diferentes atividades e visitas realizadas no Vale do Paraíba e litoral norte paulista.
“Como essa escola visa promover abordagens transdisciplinares voltadas à resolução de problemas socioambientais, acreditamos que pesquisas dentro dessas abordagens devem ser intencionais, autorreflexivas e dentro de processos que envolvam, efetivamente, os diversos atores locais”, contou Cristina Adams, professora da Universidade de São Paulo (USP) que participou da organização do evento. “Transformação significa abordar os problemas socioambientais de uma maneira realmente diferente, com novas visões e práticas, buscando provocar mudanças sistêmicas e estruturais para lidar com as múltiplas crises que enfrentamos como humanidade”, acrescentou.
Para Bryan Mariano, participante da escola, trabalhar com transdisciplinaridade e mudanças transformadoras é um objetivo não apenas para suas atividades na Fundação Florestal da Indonésia como também na Universidade de Diliman, onde dá aulas. “Ampliar a compreensão sobre a metodologia da transdisciplinaridade é uma das maiores prioridades das Filipinas neste momento, queremos que os estudantes aprendam sobre isso desde o início da graduação”, explicou Mariano. “Eu me inscrevi nesta escola para aprender mais sobre a temática e poder atingir esses objetivos.”
Já Caren Queiroz Souza, da Universidade F4xederal da Bahia (UFBA), acredita que o evento pode trazer novas ideias de pesquisa para a continuidade de sua carreira, já que defendeu o doutorado recentemente. “Eu acredito na transdisciplinaridade como uma forma de lidar e resolver os problemas ambientais que enfrentamos e a escola está permitindo que eu acompanhe as discussões mais atuais da área”, disse.
Saiba mais sobre o evento em: www.nepam.unicamp.br/spsas-transdisciplinarity/.
* Com informações de Érica Speglich e Paula Drummond, do boletim BIOTA Highlight.