banner

Como Celulares Estão Ajudando a Identificar Origem e Fraudes em Cafés Indígenas da Amazônia

6 Min

O Brasil é o segundo maior produtor mundial de cafés da espécie canéfora (Coffea canephora) e um dos líderes em pesquisa sobre esse tema. Durante um doutorado na Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas (FEA-Unicamp), foram publicados dez artigos em revistas científicas internacionais que exploram diversas abordagens para a análise e autenticidade deste café.

Um desses estudos utiliza imagens digitais feitas com celulares comuns para autenticar a origem geográfica dos cafés canéforas cultivados por indígenas em Rondônia e detectar adulterações. O método, baseado no sistema RGB (red, green, blue), extrai coordenadas de cor das amostras de café moído por meio de um dispositivo projetado com tecnologia de impressão 3D acoplado ao celular. A análise sob condições controladas garante a precisão dos dados obtidos.

A professora Juliana Azevedo Lima Pallone, também da Unicamp, complementa que o modelo criado pode ser adaptado para detectar adulterações com outros produtos, além do café arábica (Coffea arabica). Com a utilização de amostras laboratoriais, a equipe formulou técnicas adequadas para ajustar e treinar o modelo para diferentes adulterantes, como casca de café e sementes de açaí.

Os estudos adicionais de Baqueta e seus colegas se concentram em análises químicas e sensoriais de cafés canéforas provenientes de diversas regiões do Brasil, como Rondônia, Espírito Santo e Bahia. A pesquisa discute como fatores como metabólitos, minerais essenciais e propriedades espectrais ajudam a identificar a origem e as características únicas desses cafés.

O café canéfora, que inclui as variedades robusta e conilon, é tradicionalmente adicionado a blends ou utilizado na produção de café solúvel. Reconhecido por sua resistência e alta produtividade em regiões tropicais, o canéfora está se tornando um produto de destaque no Brasil, que já é o principal produtor mundial de café arábica.

A pesquisa de Baqueta e sua equipe aborda também a complexidade da autenticidade em cafés canéforas especiais, especialmente aqueles com indicação geográfica. Embora a avaliação sensorial seja comum, ela não determina a origem dos cafés, o que torna imperativo o desenvolvimento de métodos analíticos robustos para a autenticação.

Um aspecto notável é a qualidade singular dos cafés canéforas cultivados por indígenas em Rondônia, que se distinguem claramente dos produzidos em outras partes do Brasil. Baqueta observa que as condições locais de cultivo, combinadas com práticas sustentáveis, conferem características únicas a esses cafés. Sua tese de doutorado é a primeira no Brasil a investigar quimicamente o café cultivado por indígenas, destacando seu potencial no mercado premium.

Os projetos financiados pela FAPESP foram fundamentais para mostrar que os cafés canéforas das regiões estudadas têm composições químicas distintas em relação aos cafés arábicas e que podem ser comercializados como cafés especiais.

Os cientistas também utilizaram técnicas analíticas avançadas, como espectroscopia no infravermelho e ressonância magnética nuclear, para identificar características exclusivas entre os cafés canéforas brasileiros. A análise abrangente destaca o papel fundamental da ciência de dados para tratar grandes volumes de informações, conectando a análise química à autenticidade da origem.

A detecção de adulteração foi um foco importante da pesquisa. Inversamente ao que se havia feito até então, a equipe investigou a possibilidade de que insumos como soja ou milho fossem usados para adulterar cafés canéforas. Os métodos utilizados conseguiram identificar adulterações a partir de especulações bem sutis, como 1% de impuridade.

Com o aumento dos preços do café devido a variadas causas, como mudanças climáticas e oscilação na demanda, cresce a probabilidade de práticas fraudulentas. Tais adulterações comprometem a autenticidade do produto e enganam o consumidor. Profissionais de controle de qualidade estão cada vez mais preocupados com o que tem sido chamado de "café fake", uma prática que gera implicações para a saúde do consumidor.

Essa situação ressalta a urgência de aperfeiçoar as metodologias analíticas para detecção de fraudes no café e aprimorar a regulamentação para garantir a transparência e a qualidade ao longo da cadeia produtiva.

Os artigos resultantes dessa pesquisa estão disponíveis nas seguintes publicações:

  1. Multiplatform Path-ComDim study of Capixaba, indigenous and non-indigenous Amazonian Canephora coffees. (Food Chemistry).
  2. Enhancing mass spectrometry interpretability by ComDim-ICA multi-block analysis: Geographical and varietal traceability of Brazilian Coffea canephora. (Talanta).
  3. Independent components–discriminant analysis for discrimination of Brazilian Canephora coffees based on their inorganic fraction: A preliminary chemometric study. (Microchemical Journal).
  4. An overview on the Brazilian Coffea canephora scenario and the current chemometrics-based spectroscopic research. (Food Research International).
  5. Authentication of indigenous Brazilian specialty canephora coffees using smartphone image analysis. (Food Research International).
  6. Spectroscopic and sensory characterization of Brazilian Coffea canephora terroir and botanical varieties produced in the Amazon and Espírito Santo implementing multi-block approaches. (Journal of Food Composition and Analysis).
  7. Brazilian Canephora coffee evaluation using NIR spectroscopy and discriminant chemometric techniques. (Journal of Food Composition and Analysis).
  8. Authentication and discrimination of new Brazilian Canephora coffees with geographical indication using a miniaturized near-infrared spectrometer. (Food Research International).
  9. Discrimination of Robusta Amazônico coffee farmed by indigenous and non-indigenous people in Amazon: comparing benchtop and portable NIR using ComDim and duplex. (Analyst).
  10. 1H NMR, FAAS, portable NIR, benchtop NIR, and ATR-FTIR-MIR spectroscopies for characterizing and discriminating new Brazilian Canephora coffees in a multi-block analysis perspective. (Chemometrics and Intelligent Laboratory Systems).

Informações da Agência FAPESP

Compartilhe Isso