A necrose, a morte precoce de células, é frequentemente associada a danos severos no organismo. Contudo, um recente estudo publicado na revista eLife revelou uma perspectiva inovadora: a necrose não apenas provoca estragos, mas também pode ativar processos de cura no corpo humano. Essa pesquisa enriquece nossa compreensão das respostas celulares após eventos traumáticos, como derrames e ataques cardíacos.
Diferentemente da apoptose, a morte celular programada e controlada, a necrose é um processo desorganizado. Ele se desencadeia em resposta a lesões drásticas nos tecidos. Entretanto, mesmo sendo inicialmente considerada prejudicial, a necrose pode impulsionar reações positivas em nosso corpo, afirma um time de científicos da Universidade Estadual do Arizona (ASU).
Pesquisadores observam, pela primeira vez, células que atuam em necrose e regeneração
Os cientistas examinaram moscas-das-frutas, um modelo que se destaca por sua habilidade regenerativa. Durante o processo de necrose, a equipe de pesquisa observou que células vizinhas às afetadas emitem sinais que atingem outras partes do tecido. Esses sinais são cruciais, pois eles estimulam o crescimento celular em áreas saudáveis, demonstrando uma resposta surpreendente ao processo de necrose.
Os autores do estudo descobriram que enzimas específicas, conhecidas como caspases, desempenham um papel fundamental na mediação desses sinais. Na apoptose, essas enzimas atuam como delegadas da morte celular, mas neste contexto diferem, ocupando o papel de responsáveis pela reparação tecidual, ativando células distantes.
“Essa descoberta é significativa, pois não apenas confirma que as caspases participam de sinais que estimulam a regeneração, mas também demonstra pela primeira vez que esse fenômeno pode ocorrer após a necrose”, declarou Rob Harris, geneticista e biólogo da ASU, em um comunicado divulgado pela universidade.
Para compreender melhor essas dinâmicas, os pesquisadores ampliaram uma pesquisa realizada em 2021, que já havia identificado sinais emitidos por células necróticas. Agora, o grupo científica identificou células específicas chamadas Caspase Positiva Induzida por Necrose (NiCP), que reagem à necrose por meio de respostas de regeneração.
Próximos passos
Apesar de as descobertas ainda não terem sido validadas em modelos humanos, a compreensão desse mecanismo pode abrir novos horizontes para tratamentos mais eficazes. Isso é particularmente relevante, considerando que o corpo humano tende a perder sua capacidade de autorregeneração à medida que envelhece.
A próxima etapa dos cientistas consiste em desvendar por que apenas algumas células NiCP sobrevivem após os eventos de necrose. Essa resposta poderá ser fundamental para o desenvolvimento de novas estratégias para acelerar processos de cicatrização e regeneração de tecidos.
A análise dessas interações celulares sugeridas pelas recentes descobertas pode direcionar pesquisas futuras no campo da medicina regenerativa. “Por enquanto, [as descobertas do estudo] revelam uma importante resposta genética à morte celular que pode ser aproveitada para melhorar a regeneração de feridas necrosadas“, concluiu Harris.
Essas novas possibilidades sugestivas podem revolucionar tratamentos em áreas críticas da saúde humana. Enquanto as experiências em moscas-das-frutas contribuem para o entendimento básico, as aplicações desses mecanismos no reparo de tecidos e recuperação de funções podem se tornar um divisor de águas no futuro.
Com a ciência continuamente desvendando os mistérios por trás da necrose, expectativas razoáveis são estabelecidas sobre o avanço no tratamento de condições que afetam a qualidade de vida dos pacientes. A jornada para explorar as potencialidades da necrose ainda está apenas começando, mas seus impactos já começam a ser vislumbrados.