Usando técnicas de sequenciamento, pesquisadores conseguiram associar 51 mutações identificadas no genoma mitocondrial à esclerose lateral amiotrófica (ELA), doença incurável que afeta o sistema nervoso provocando degeneração progressiva e paralisia motora irreversível. Do total das variações, 13 aumentam o risco para ELA e 38 são protetivas. O estudo sugere ainda que essas variantes podem ser importantes para futuros testes e pesquisas sobre a doença.
As mitocôndrias – organelas que produzem energia para a célula – possuem um DNA próprio (mtDNA), herdado somente da mãe. Mutações no mtDNA podem causar diversos tipos de doenças, quase todas afetando processos neuromusculares.
Publicado na revista Muscle & Nerve, o trabalho analisou 1.965 genomas de pacientes do banco do Centro de Genoma de Nova York – o consórcio ALS, uma parceria de cientistas de 45 instituições mundiais voltada ao sequenciamento e estudo genômico da ELA – e outros 2.547 do grupo de comparação (os “controles”).
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O grupo analisou o genoma mitocondrial, que é um “pedaço” de DNA encontrado nas mitocôndrias das células, as organelas responsáveis pela produção de energia. Também conhecido como DNA mitocondrial (mtDNA), ele é único por ser herdado exclusivamente da mãe, ao contrário do DNA nuclear que é uma combinação dos pais. Entre as causas da esclerose lateral amiotrófica estão fatores genéticos e hereditários – cerca de 10% dos casos são provocados por um defeito genético. Na prática, os neurônios dos pacientes se desgastam ou morrem, deixando de “mandar mensagens” aos músculos.
No Brasil, são poucos estudos epidemiológicos sobre a doença. Estima-se que o número de casos (prevalência) seja de 0,9 a 1,5 por 100 mil habitantes por ano, com o início dos sintomas ocorrendo, em média, a partir dos 55 anos.
Os pesquisadores usaram uma abordagem chamada de estudo de associação genômica ampla (GWAS, na sigla em inglês de genome-wide association study) para identificar pequenas variações genéticas – os polimorfismos de nucleotídeo único (SNVs ou SNPs). Ao comparar a frequência dos polimorfismos, se um SNP específico for significativamente mais comum nos pacientes do que no grupo de controle, ele pode estar associado à doença.
Com isso, as 13 variações com aumento de risco para a doença foram localizadas em dez genes – HV1, HV2, HV3, RNR1, ND1, CO1, CO3, ND5, ND6 e CYB. As 38 mutações protetivas apareceram nos genes HV1, HV2, HV3, RNR1, RNA2, ND1, ND2, CO2, ATP8, ATP6, CO3, ND3, ND4, ND5, ND6 e CYB. Todas as variações têm valor p menor que 10-7. As que aumentam o risco têm odds ratio (OR ou razão de risco, medida epidemiológica que estima a chance de um evento ocorrer) maior que 1, e as que diminuem, menor que 1.
Na grande maioria dos casos, a ELA se caracteriza por não seguir um padrão “mendeliano” de herança genética. O principal fator nesse padrão é a herança citoplasmática, ou seja, fora do núcleo das células, cujo principal exemplo são justamente mutações nos genes do DNA mitocondrial. Essa é outra razão da relevância do trabalho.
Os pesquisadores brasileiros querem agora aplicar inteligência artificial para analisar os dados dos quais dispõem. Além disso, pretendem sequenciar amostras de uma coorte de pacientes do Brasil e comparar com as 51 mutações detectadas no estudo.
O artigo Mitochondrial genome variants associated with amyotrophic lateral sclerosis and their haplogroup distribution pode ser lido em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/mus.28230.
Informações da Agência FAPESP